20.11.08

[NIGHT] TRAIN TO LISBON

Às vezes acho ridículo o esforço mental e físico que pomos em certos acontecimentos da nossa vida que depois se resumem a 30 minutos da nossa existência. Consumimo-nos durante dias e dias, horas e horas, arrastamos as pessoas de que gostamos para elas, sentimo-nos em ebulição, turbulência e depois, 30 minutos depois, passou e com isso tudo o que foi investido. Dum momento para o outro fazemos tábua rasa desse investimento e achamos que até foi fácil esquecendo os outros milhares de minutos de preparação.
Foi assim que foi, de repente ali estava eu: as palavras eram minhas, a língua nao era a minha, a apresentação era minha porém. A audiência foi minha por 30 minutos, 150 pares de olhos escutavam-me atentamente e lembro-me de distinguir certas caras e focar em diferentes partes da sala. No momento seguinte tinha terminado e já só me lembro de estar sentada a escutar outra apresentação. Parei 2 segundos e pensei, também estive ali. Senti de repente um enorme cansaço, mal dava para aguentar os olhos abertos e mais uns momentos lembro-me de estar de regresso no comboio rumo a Hamburgo.
O título deste post roubei-o a um livro que acabei de ler. Escusado será dizer que o comprei por isso. Curiosidade julgo eu, a sinopse referia a história dum académico suíço alemão em Lisboa. Em busca do autor português dum livro comprado em Berna, ele vai divagando e deambulando pela cidade, pela minha cidade, que também é de muitos outros. Foi a minha companhia para os dias passados em terras germânicas e especialmente apropriado para as viagens de comboio. Como companhia também tive uma colega de trabalho, mas daquelas pessoas das quais não sabemos muito, ficamos a saber um pouco mais, mas não ainda o suficiente para sentirmos que temos algo em comum. Aliás hoje acrescentaria que percebemos que por mais tempo que passemos juntas mais diferenças encontraremos e menos coisas em comum.
Saímos do primeiro comboio para trocar quando resolvemos perguntar à chefe de estação qual era a plataforma para Hamburgo. O perguntar foi relativo, limitámo-nos a dizer Hamburg. A senhora repetiu Hamburg e apontou de volta para o mesmo comboio. Meio atarantadas voltámos a perguntar. A senhora voltou a repetir e desta vez com um olhar fulminante que eu senti que se não desátassemos prontamente a correr para o comboio bater-nos-ia com o sinal. Corrida rápida, o condutor esperou por nós e voltámo-nos a sentar.
Abri o livro e resolvi relaxar, envolvida nestas palavras que passo a transcrever:

‘AMPLIDÃO INTERIOR: we live here and now, everything before and in other places is past, mostly forgotten and accessible as a small reminiscent in disordered slivers of memory that light up in rhapsody contingency and die out again. This is how we are used to think about ourselves, and this is the natural way of thinking when it is others that we look at: they really do stand before us here and now, no other place and no other time. How should their relationship to the past be thought or if not in the fore of internal episodes of memory whose exclusive reality is in the present of their happening?
(…) and not only in time are we expanded, in space, too, we stretch out far over what is visible. We leave something of ourselves behind when we leave a place; we stay there, even though we go away. And there are things in us that we can find again only by going back there… What matters is to move surely and calmly, with the appropriate humour and melancholy in the temporally and spatially expanded internal landscape that we are.
Why do we feel sorry for people who can’t travel? Because, unable to expand externally, they are not able to expand internally either, they can’t multiply and so they are deprived of the possibility of undertaking excursions in themselves and discovering who and what else they could have become…’

Fui interrompida, o revisor examinava os nossos bilhetes e demonstrava um ar procupado. Falava e eu tentava apanhar as legendas. Tudo o que ouvi foi Berlim... pois sim, íamos a caminho de Berlim no caminho contrário a Hamburgo e já com 1h 30m de caminho no sentido inverso. Tentámos explicar o que nos tinham dito na estação, mas ele encolheu os ombros e limitou-nos a escrever o horário e estação onde mudar e o preço adicional que teríamos de pagar no comboio seguinte. Desanimadas mas rendidas ao inesperado saímos da estação para descobrir que o comboio que nos levaria ao destino final estava 45 minutos atrasados. Voltámos a esperar, voltámo-nos a render. O comboio finalmente surgiu no horizonte e eu subi e sentei-me. O som da locomotiva fez soar de novo as palavras que tinha lido... e por um momento fechei os olhos e desejei do fundo que o comboio fosse não para Hamburgo mas para Lisboa...

‘… life is not what we live; it is what we imagine we are living…’ [Pascal Mercier].

17.11.08

DANCE CLASS 3

Às vezes percebemos que não são só os movimentos que fazem uma aula de dança. A aula de dança pode-se tornar um mundo novo se se mudam os instrumentos e a musicalidade. Um ‘tchello’ como eles dizem, a melodia do nome dito assim se adequa mais do que ao nosso ‘violoncelo’, mais ríspido, mais frio.
Eu também pensava que os ‘celos’ se mantinham de pano de fundo na orquestra, nunca lhes prestei atenção. Mas ouvindo a solo, o ‘celo’ ganha vida e torna-se música, da mais profunda que já ouvi, daquela que nos toca, nos entranha e devolve a vida. Foi assim, o ‘celo’ entrou e eu deixei-me ir e não parei. Estendi os meus limites, entreguei-me à musicalidade e inspirei cada nota, cada vibração. Senti-me feliz, oh, como a vida podia ser tão simples, mudávamos-lhe os instrumentos e a música transformar-se-ia...
De repente parei 2 segundos com o brilhantismo da minha analogia... Será? Pensei eu... Será que o segredo não está na música mas nos instrumentos? Porque a música é a mesma, aliás não é diferente da do piano... Será? Ou apenas sinto-a diferente quando o músico a toca no ‘celo’, porque parece que a abraça, despede-se e entrega-a à vida?...

13.11.08

SEU JORGE

No outro dia fui ver Seu Jorge. Show de bola! Sensacional!
Fui com a galera brasileira: Marcelinho, Tiana e Pocahontas.

Seu Jorge começou com Tive razão, meu som favorito.

Tive razão

Posso falar
Não foi legal, não pegou bem
Que vontade de chorar, dói
Em pensar que ela não vem, só dói
Mas pra mim tá tranquilo, eu vou zoar
O clima é de partida, vou dar sequência na minha vida
E de bobeira é que eu não estou,
E você sabe como é que é, eu vou
Mas poderei voltar quando você quiser.
ô ô ô ô ô ô ô ô, lá lá lá...Demorô vai ser melhor...

Muito bom! Dancei, pulei, cantei, eu sei lá... Maneiro, muito maneiro...
Poh, cara, problema desses sítios é que o pessoal vive passando e parando na minha frente. Bah, não sou grande, não. Neguinho fica na minha frente e nao dá para ver nada. Poca virou: - Por isso trago esse sapato! Mostrava o sapato bem alto, eu me sentia ainda mais pequenininha.

Aí, uma das vezes, um cara passou e ficou bem na minha frente e deixei de ver Seu Jorge. Pocahontas virou furacão. Aí, chamou o cara. – Oh, tu aí? Você passa ou tá pensando em ficar??? É que a minha amiga aqui nao tá vendo nada. E nós estávamos aqui primeiro. Moleque! Passa aí!
Tava sorrindo quando o cara do lado me perguntou. – what happened?

- Oh, my friend scared the guy away. I couldn’t see a thing. – respondi..
– Does it happen very often with your friend?
Aí respondi, - Why do you think I bring her? She scares the unwanted ones away...
Aí, o cara riu muito e eu pensei: - Até que você é bem gostoso... , tipo Clive Owen… grande e ar de durão...
Tiana chamou. – Gurias, esse cara aí tá-vos paquerando...
- Que cara, Tiana?
- O aí do lado, o grandão... Não tira olho de vocês…

- Bah!, respondeu Pocahontas, o cara tá com uma gúria aí, aquela brasileira, bem grandona...
- Jura??? Oh, com guria ou não, não sei, mas que tá olhando, tá.
- Poh, Tiana, que é que a gente pode fazer? A brasileira dá-nos um tapa que a gente sai voando...
- Além disso, o cara aí é muito mauricinho para mim,
falou Pocahontas. Tiana sorriu e continuou sambando.
Pocahontas se vira: - Ena, olha lá!!! O Cascãozinho? Gúria, ele é bem gostosinho…
- Cascãozinho, Mauricinho, Poca nao tou entendendo nada… De que é que você está falando?
- Oh, Portuguesa, você nao lembra a turma da Mónica? Então? Tinha o Cebolinha, o Mauricinho. Eh, pois é, esse aí era o cheirosinho e o Cascão era o outro que nao tomava banho... Eu sou mais Cascão, Mauricinho é meio chato.
- Eh, não sabia, guria. Nunca imaginei que tu Poca fosse Cascão.
- Poh, fui eu que lancei a moda de Cascão. Sem mim, Cascão nao tinha chance nenhuma.
- Eh, pode ser! Entao você é a famosa Cascuda!??

Aí, acho que Poca nao achou muita graça, não. Eu ainda pensei que ela ia virar Mónica e fiquei esperando tapa com o Sansão. Mas não.
- Oh, brasileira, tava brincando. Você de Cascuda já imaginou? Poca não aguentou e começou a rir...
– Prainha, acho que esse Cascão, não é para mim, não... Poh, muito baixinho, esse é para você, Xuxa...

12.11.08

DANCE CLASS 2

Já bastavam os dilemas duma aula de dança da semana passada desta vez dei comigo numa aula de contemporary + breaking. Isto numa tentativa de escapar duma das aulas mais populares da escola.
Sei que parece estranho, mas por mais fantásticas as aulas possam ser o meu corpo sente-se entediado. A sensação de que toda a gente gosta das aulas, porque a professora é um doce, mas o corpo recusa-se a entranhar tais movimentos porque está aborrecido.
Ele mexe no ritmo, no tempo certo, com os movimentos certos, mas pede-me outra vez não, please… Fiz-lhe a vontade e fui experimentar uma aula cheia de footwork para todos os níveis. Achei que era uma boa oportunidade para trabalhar os meus pés…
O meu cérebro nao assimilou o que poderia ser o breaking, já vejo alguns a sorrir. Pois o breaking era mesmo breakdance, estilo anúncio da NIKE. JUST DO IT!!! O estilo cool: - Feel the groove guys, do you feel it? I’m here, that’s what I’m here for. Em background James Brown – get up! Get on up! Get up! Get on up!
Por mais divertida que possa ter sido a aula precisamente porque o meu corpo batalhava em feeling the groove, há coisas que nao se entranham… I know breaking is a bit masculine but this is my favourite move because it is bit girlish, disse Kate, a professora… Pois deve ser por isso que não entranho, também me falta o capuz, as calças largas, e todo o estilo urbano. A professora ria-se para mim provavelmente a pensar: - oh, Girl you are absolutely in the wrong class… you are funny!!!

Até a japonesa ao meu lado tinha mais feeling que eu, estão a ver a hipopótama no Fantasia da Disney a dançar ballet? Não tem nada a ver! Imaginem agora a hipopótama a dançar break dance?… Muito melhor que eu.
Aprendi o ‘baby freeze’, praticamente a ficar congelada numa posição e aguentar o corpo todo numa mão. Claro que no meu caso fiquei congelada mas não consegui sair dela, simplesmente por falta de forças para libertar o meu corpo do desafio. Lá para o fim, já me orientava numas outras quantas acrobacias.
Moral da história: descobri por que lhe chamam breaking... Uma semana passou e eu aindo me sinto toda quebradinha...