5.6.08

TIERRA DEL FUEGO

22 de Abril de 2008

Se houvesse uma razão para ficar no fim do mundo essa poderia chamar-se Sébastian. É verdade que os Argentinos sempre tiveram fama, mas daí até ser confrontada com as evidências é outra história: alto, bem parecido, desportista, falador (característica tipicamente argentina, adoram ouvir-se), charmoso, cativante, assim se apresentou o nosso guia / condutor.

Antecipando um bater de pestanas por parte do mulherio tratou logo de esclarecer o seu estado civil de comprometido e os dois rebentos lá de casa: um com 18 meses e outro com 11 meses. Antes que alguém dissesse algo, deu uma gargalhada, sorriso maroto e confessou: " - Adoro ver a reacção das pessoas a puxar pela matemática, tentando perceber como é possível tal pouca diferença de idade, bem na verdade, os meus rebentos são mais do tipo canídeo!"

Não estávamos realmente preparadas para tal encontro, muito menos para a aventura que se seguia: explorar a Terra do Fogo num Todo-o-Terreno. Como podem imaginar não éramos os únicos com o Sébastian, do grupo constavam uma italiana, Giovanna, sua amiga Irene, argentina; Christine, francesa com o seu Mohammed, marroquino. E não fosse a nossa presença e arriscaria a dizer que a média das idades rondaria os 45 anos. Oficialmente júniores em tal expedição fomos promovidos à brigada do fundo na ré do jipe, definitivamente o local mais emocionante desta viagem, quer dizer, tirando o lugar da Giovanna junto ao condutor...

Em busca do Lago Escondido demos início à subida da montanha. Ora bem, montanha equivaleu a neve também e em pleno Outono deparámo-nos com uma paisagem mais parecida com um Natal branco, ou o que eu imagino que seja. Vimos o nosso Sébastian em plena acção de Indiana Jones socorrendo um carro preso na neve por falta de correntes e ainda tivémos oportunidade para uma batalha campal de bolas de neve. E dar-nos-iam mais tempo e até um boneco teríamos arriscado fazer, mas esperava-nos outra aventura - canoagem.

Aqui entre nós, já lá vão os tempos em que experimentei canoagem, confesso que na altura as memórias limitaram-se a círculos em redor da canoa, sem sair quase do mesmo lugar e acho que lá mais para o fim, um empurrão dum engraçadinho e um mergulho no lago. Desta vez pelo menos as canoas eram para dois portanto maior facilidade em manejar e a mim coube-me o papel de capitã e manobradora do leme. Juntámo-nos a outro grupo de espanhóis e um casal de brasileiros. Passadas as explicações e já dentro de água, ouvimos Walter, o outro guia: - Hey, Brasil! Esto non es Venezia, non. Tienen de remar! Ao longe ele esforçava-se por manter o ritmo da canoa tal e qual gondoleiro apaixonado, ela completamente relaxada limitou-se a encolher os ombros e a sorrir timidamente enfatizando as suas expressões de japonesa. De volta à margem, recolhemos a canoa e encaixados no 4x4 lá fomos à segunda actividade do triatlo fueguino.

Reza a história que o nome desta terra foi o nosso compatriota Magalhães que pôs aquando da sua descoberta do estreito. Chamou-lhe inicialmente terra do fumo, pois ao longe viam-se as queimadas que os nativos faziam para suportar as temperaturas baixas da altura, mas como não há fumo sem fogo, Terra do Fogo ficou. O que é certo é que se não soubesse disto, acharia que o nome advém das cores desta paisagem, perfeita metáfora para esta estação do ano.

Continuando a viagem, embrenhámo-nos pela floresta onde vimos árvores tombadas pelos castores, animais estes introduzidos no ecossistema há algumas dezenas de anos e que têm testado até ao limite o equilíbrio ecológico desta área. Tal é a destruição que quando Sébastian entusiasmado nos mostrou um castor, de Giovanna só ouvimos um "BASTARDO!!!" Afugentámos o bicho, mas parece que à hora que o vimos também não é muito normal "passearem" pois só saem de noite.

Num 4x4 podem imaginar que desafiámos as leis da natureza, entre lama, árvores, terrenos movediços, lago, experimentámos tudo, Sébastian não se cansou enquanto não demonstrou todas as proezas do seu "brinquedo". A Brigada do fundo em posição (apesar de ter pouca memória do assento, acho que passei mais tempo fora que dentro do banco) achou divertido e recomenda a aventura.

Claro que triatlo significa três, a última aventura resumiu-se a dar cabo dum monte de carne em três tempos antes que o resto dos grupos chegassem. Levaram-nos a uma fazenda em plena paisagem fueguina onde também se fazem criação de cães da Antárctica para aventuras de trenó. A neve realemente não era suficiente para tal experiência mas pelo menos fomos cumprimentar os cães. Maiores que eu, à excepção dos mais cachorrinhos, senti-me tal e qual criança pequena atrás da cachorrada. "Giovanna viene aquí, el perro quiere bailar contigo y Irene puede te sacar la foto!" Sébastian demonstrava como os cães eram grandes, quase atingindo a sua estatura. "Giovanna, el perro, non yo!" Italiana não se faz rogada, o rapaz a mostrar-lhe o cão e ela agarrada ao braço do Sébastian: " ' Irene, saca la foto. Con Sébastian, claro!" E esta, hein?

Voltámos ao nosso hostal e eu fui-me despedir dos nossos mais recentes amigos. Eram as nossas últimas horas de Ushuaia dado que partiríamos pela madrugada. Contei as aventuras do dia e planos até que Gregg fixou-me o olhar, franziu o sobrolho: - Will you keep going like this? Such intense holiday? You'll need holidays after this!" Limitei-me a dar uma gargalhada, nem ele sabe da missa a metade...







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