14.6.08

FERNÃO DE MAGALHÃES

Alvorada chegou e de malas aviadas deixámos o hostal para trás. Uma noite meio atribulada devido ao calor infernal que se fazia sentir no quarto, um canadiano que ressonava desafiando as leis da paz nocturna e três pares de olhos que se recusavam a fechar: Prainha, Té e Yoni.
Deixámos Ushuaia para trás às 4h da manhã a caminho de Rio Grande...



O começo duma viagem, de um percurso que se avistava cheio de histórias, de emoções, de sensações... De certa forma, eles tinham razão...

O nascer do sol antevia um dia perfeito, ao mesmo tempo que revelava uma paisagem árida de cores constantes entre os tons terra e o céu azul... Os meus olhos fechavam de vez em quando para voltarem a abrir e encontrar a mesma vastidão.
Paragem na fronteira argentina para atravessar a terra de ninguém, a imagem total do fim do mundo, do isolamento da Terra do Fogo. Senti-me invadida por essa mesma solidão e a minha mente parece que disparou e perdeu-se... Voltei a encontrar-me já no Chile junto ao Estreito de Magalhães...

'Esperamos un rato por el barco!' - disse-nos o condutor...
O rato virou ratazana e percebemos que não fazia sentido ficarmos dentro do autocarro. Resolvi ir explorar o Estreito de Magalhães ou a vista dele, sentir parte da História a que nos habituámos a ler em livros escolares, de imagens de naus e caravelas, professores entusiastas proclamando as glórias nacionais, Fernão de Magalhães entre tantos outros heróis... o que nunca nos contaram é que parece Fernão não se encontrava ao serviço da nossa coroa, aliás por estas bandas poucos sabem que ele era português...

Do estreito pouco há a dizer aparte do peso da história e do nome que nos remete para outros tempos. Um estreito que mais parece um mar agitado. Uma imensidão de água que me fez sentir pequenina e um vento que quase me fez voar. Estreito, metáfora da escala patagónica onde tudo atinge proporções gigantescas e onde nos coloca na nossa condição de mero mortal.

Depois de desafiar o vento magallino dirigimo-nos para o único café do estreito - um barracão no meio do nada e duma fila de automóveis e camiões que se aglomeravam esperando o mesmo - para encontrarmos o condutor saboreando o seu almoço na maior das calmas. Intrigados fomos perguntar quanto tempo tínhamos mais. Respondeu-nos no mesmo ritmo: - Unas 4 o 5 horas! El barco non he partido, hace mucho viento. Esperamos el viento parar!

Pouco havia a fazer, sentámo-nos a contemplar a paisagem e os outros passageiros que entravam e saíam do café dirigindo-se ao autocarro. Deparei-me com uma cara familiar, lembrava-me dele do nosso hostal. Tínhamos trocado sorrisos o dia anterior. Tentei chamá-lo, mas Té teve mais sorte e perguntou-lhe se não se queria juntar a nós. Tímido, sorriu e desculpou-se... Queria aproveitar o vento! Entre nós, encolhemos os ombros e pensei quantas horas iria ele aguentar o vento?!

Estava certa, passados uns minutos voltou e sentou-se. Chamava-se René, era suíço e viajava desde Novembro. Era para ter regressado após 4 meses mas foi adiando para regressar para o Euro, achava ele, entretanto tinha marcado a viagem nos últimos dias para Julho, quando a mãe chamou a atenção que isso era o final do euro e não o começo. Não haveria muito a fazer, a viagem já não poderia ser alterada mais nenhuma vez, portanto havia que aproveitar...

Dos portugueses, conhecia poucos mas gostava deles. O último encontro tinha sido no Chile. Tinha conhecido a Nelly Furtado. 'So pretty! Very nice! See? What do you think?' orgulhoso mostrava-nos a foto com ele e uma Nelly loura. Sorri: - Yes, René you are pretty too... Tímido, corou e riu-se elogiando a nossa compatriota.

O barco finalmente aproximava-se... As ondas impunham respeitando levantando-se à altura do navio e a nós não nos foi permitido sair do autocarro. O percurso durou 30 minutos e depois de mais umas horas de caminho estaríamos em Puerto Natales. René dirigia-se para o mesmo lugar, tínhamos feito mais um amigo de viagem e companheiro de quarto...

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