2.8.10

DISSE-ME UM ADIVINHO


Este é um título dum livro que acabei de ler. Não é novidade que volta e meia ´roubo´ os meus títulos aos livros que leio, mas acho que já percebi porquê. É que eu apesar de adorar ler, nem sempre encontro a disponibilidade mental para o fazer, mas quando o faço sou logo transportada pelo próprio livro, para um outro mundo, um outro tempo e acabo por viver um bocadinho nesse momento diferente (ao fim e ao cabo deveria ser para isso para que servem os livros) e é realmente nesse estado mental que depois me apetece escrever.
Voltando ao livro, é dum senhor italiano chamado Tiziano Terzani que viveu grande parte da sua vida na Ásia e mais importante que isso conheceu uma Ásia que muitos poucos conhecem, que é a Ásia de há 20 anos atrás. Assim um pouco como nós, ´macaenses´! De repente dei por mim a recordar e a compreender uma série de coisas que na altura não tinha idade para isso.
Viveu em Hong-Kong, portanto refere várias vezes o Macau de outrora e a China de então. Isto tudo a pretexto dum Adivinho de Hong-Kong que prevê uma catástrofe no ano de 1993 se ele apanhar algum transporte aéreo. Sendo este senhor jornalista e correspondente asiático, a sua vida torna-se mais complicada, mas mesmo assim ele decide não viajar de avião durante um ano e embarca numa épica viagem pela Ásia a reportar os acontecimentos políticos da altura.
É daqueles livros ´biográficos´ em se contam vidas que nós achávamos que já não existiam, cheias de romantismo e espírito de aventura, alguém que testemunhou acontecimentos importantes para a História do mundo.
Nada a ver propriamente com a minha vida, mas tenho algumas semelhanças com este senhor. Não apenas porque vivi na Ásia e sei do que ele fala como também há muito tempo atrás também eu fui a um adivinho chinês... Por brincadeira, por graça, porque como diria o Tiziano, para quem viveu na Ásia tanto tempo há coisas que não se podem deixar de fazer e ir a um adivinho é uma delas. Ásia é mística e supersticiosa. Lembro-me perfeitamente, fui com dois amigos e acho que, de certa forma, independentemente daquilo que nos disse a cada um de nós, ninguém saiu de lá completamente indiferente.
Disse-me um adivinho que ia ter uma vida cheia de histórias. Ri-me, nada que eu já não soubesse e se calhar mais importante, desejasse. E sim!, quem sabe se não fui eu que sugestionei isso ao adivinho? Se nas minha expressões faciais ele não achou que eu tinha um espírito aventureiro. Uma vida muito boa, disse-me ele, e apontava para uma série de dizeres num livro cheio de pó e de amarelecido pelo tempo.
E isto serviu-me de mote para muita coisa, talvez pelo ar determinado e cheio de certezas desse adivinho, achei que tudo o que fizesse me daria no fundo a tal vida boa cheia de histórias que ele previa. Se o Tiziano também assumiu esta maldição como uma desculpa, também eu tenho vivido esta "bendição" como desculpa de querer fazer mais, porque no fundo penso para mim, no fundo terei uma vida feliz. Não é isso que todos nós queremos?
É verdade que as minhas histórias não se comparam ao Senhor Tiziano, as minhas são bem mais modestas, que nem valem a pena serem contadas ao mundo. Mas no fundo são as MINHAS histórias, mais banais, mais supérfluas e que uma vez por outra conseguem arrancar uma gargalhada aos meus amigos e eu sorrio. Se eu tenho uma história que consegue fazer rir alguém, então já valeu a pena...
Disse-me um adivinho que o meu destino não estava totalmente fechado e que iria variar ao longo do tempo... Será que ele não teria razão, da mesma forma que me previu uma proposta de casamento aos 24 (e que ironicamente aconteceu, mas em tom de graça!)?
No fundo o que eu aprendi com este adivinho e com a distância e a maturidade é que realmente é a nós que nos cabe criar o nosso próprio 'destino'. E aí, Tiziano foi o mestre...
"Quando o meu relógio marcou indiferente, a meia noite, a decisão de não voar já se tornara clara.(...) Todavia parecia estar a fazer uma coisa arrojada, quase proibida. Após uma vida sensata, sob o signo da razão, permitia-me agora uma decisão fundamentada na mais irracional das considerações, impondo a mim próprio uma limitação insensata (...) Foi uma excelente decisão e o ano de 1993 acabou por ser um dos mais extraordinários que vivi. Era para ter morrido e afinal renasci. Aquilo que parecia ser uma maldição afinal revelou-se uma verdadeira benção (...) Digam o que disserem, uma pessoa tem sempre curiosidade de conhecer o seu destino."